Sunday, May 29, 2005

"os que se esquecem do passado estão condenados a revivê-lo"
George Santayana, te life of reason, 1905
Je voudrais pas crever
Je voudrais pas crever
Avant d'avoir connu
Les chiens noirs du Mexique
Qui dorment sans rêver
Les singes à cul nu
Dévoreurs de tropiques
Les araignées d'argent
Au nid truffé de bulles
Je voudrais pas crever
Sans savoir si la lune
Sous son faux air de thune
A un coté pointu
Si le soleil est froid
Si les quatre saisons
Ne sont vraiment que quatre
Sans avoir essayé
De porter une robe
Sur les grands boulevards
Sans avoir regardé
Dans un regard d'égout
Sans avoir mis mon zobe
Dans des coinstots bizarres
Je voudrais pas finir
Sans connaître la lèpre
Ou les sept maladies
Qu'on attrape là-bas
Le bon ni le mauvais
Ne me feraient de peine
Si si si je savais
Que j'en aurai l'étrenne
Et il y a z aussi
Tout ce que je connais
Tout ce que j'apprécie
Que je sais qui me plaît
Le fond vert de la mer
Où valsent les brins d'algues
Sur le sable ondulé
L'herbe grillée de juin
La terre qui craquelle
L'odeur des conifères
Et les baisers de celle
Que ceci que cela
La belle que voilà
Mon Ourson, l'Ursula
Je voudrais pas crever
Avant d'avoir usé
Sa bouche avec ma bouche
Son corps avec mes mains
Le reste avec mes yeux
J'en dis pas plus faut bien
Rester révérencieux
Je voudrais pas mourir
Sans qu'on ait inventé
Les roses éternelles
La journée de deux heures
La mer à la montagne
La montagne à la mer
La fin de la douleur
Les journaux en couleur
Tous les enfants contents
Et tant de trucs encore
Qui dorment dans les crânes
Des géniaux ingénieurs
Des jardiniers joviaux
Des soucieux socialistes
Des urbains urbanistes
Et des pensifs penseurs
Tant de choses à voir
A voir et à entendre
Tant de temps à attendre
A chercher dans le noir
Et moi je vois la fin
Qui grouille et qui s'amène
Avec sa gueule moche
Et qui m'ouvre ses bras
De grenouille bancroche
Je voudrais pas crever
Non monsieur non madame
Avant d'avoir tâté
Le goût qui me tourmente
Le goût qu'est le plus fort
Je voudrais pas crever
Avant d'avoir goûté
La saveur de la mort...

Boris Vian

Wednesday, May 18, 2005

NECROLOGIA DO VERBO AMAR

Amo – lançando-se contra moinhos de vento gritava dom Quixote.

Amo – envenenado de céus gritava Otelo.

Amo –recostado em Ossian soluçava Werther.

Amo – tremendo nas carruagens de Jasvin repetia Vronski.

Amo – separando-se de Grusenka sonhava Dimitri Karamazov.

Amo –brandindo a espada recitava Cyrano.

Amo – regressando do comício sussurrava Jacques Thibault.

Amo – gritaria também o herói de um romance contemporâneo,mas o autor não lho permite.

Não está na moda.
O amor já não é contemporâneo.

Izet Sarajlic

o esquecimento

na outra margem da noite
o amor é possível

leva-me

leva-me entre as doces substâncias
que morrem cada dia na tua memória

Alejandra Pizarnik

Ofício de amar

já não necessito de ti
tenho a companhia nocturna dos animais e a peste
tenho o grão doente das cidades erguidas no princípio doutras galáxias, e o remorso
um dia pressenti a música estelar das pedras, abandonei-me ao silêncio

é lentíssimo este amor progredindo com o bater do coração
não, não preciso mais de mim
possuo a doença dos espaços incomensuráveis
e os secretos poços dos nómadas
ascendendo ao conhecimento pleno do meu deserto
deixei de estar disponível, perdoa-me
se cultivo regularmente a saudade de meu próprio corpo

Al Berto

Felizes os normais

Felizes os normais, esses seres estranhos.
Os que não tiveram uma mãe louca, um pai bêbedo, um filho delinquente,
Uma casa em parte nenhuma, uma doença desconhecida,
Os que não foram calcinados por um amor devorador,
Os que viveram os dezassete rostos do sorriso e um pouco mais,
Os cheios de sapatos, os arcanjos com chapéus,
Os satisfeitos, os gordos, os lindos,
Os rintimtim e os seus sequazes, os que como não, por aqui,
Os que ganham, os que são queridos até ao fim,
Os flautistas acompanhados por ratos,
Os vendedores e seus compradores,
Os cavaleiros ligeiramente sobre-humanos,
Os homens vestidos de trovões e as mulheres de relâmpagos,
Os delicados, os sensatos, os finos,
Os amáveis, os doces, os comestíveis e os bebíveis.
Felizes as aves, o esterco, as pedras.
Mas que dêem passagem aos que fazem os mundos e os sonhos,
As ilusões, as sinfonias, as palavras que nos desbaratam
E nos constroem, os mais loucos que as suas mães, os mais bêbedos
Que os seus pais e mais delinquentes que os seus filhos
E mais devorados por amores calcinantes.
Que lhes dêem o seu sítio no inferno, e basta.
Roberto Fernández Retamar
Fechar no punho os estilhaços
os fragmentos que conservo do teu nome
e permitir que o corte se prolongue
pela mão
pelo braço
pelas têmporas
até que a repetida sentença da carne
atravesse a cartilagem e o osso
e se consuma no rito de um flagelo
apenas comparável à tua ausência.

Laura C. Skerk

Adeus Português

Nos teus olhos altamente perigosos
vigora ainda o mais rigoroso amor
a luz dos ombros pura e a sombra
duma angústia já purificada.

Não tu não podias ficar presa comigo
à roda em que apodreço
apodrecemos a esta pata ensangüentada que vacila
quase medita e avança mugindo pelo túnel
de uma velha dor

Não podias ficar nesta cadeira
onde passo o dia burocrático
o dia-a-dia da miséria
que sobe aos olhos vem às mãos
aos sorrisos ao amor mal soletrado
à estupidez ao desespero sem boca
ao medo perfilado
à alegria sonâmbula
à vírgula maníaca
do modo funcionário de viver

Não podias ficar nesta casa comigo
em trânsito mortal até ao dia sórdido
canino policial até ao dia que não vem da promessa
puríssima da madrugada
mas da miséria de uma noite gerada
por um dia igual

Não podias ficar presa comigo
à pequena dor que cada um de nós
traz docemente pela mão
a esta pequena dor à portuguesa
tão mansa quase vegetal

Mas tu não mereces esta cidade não mereces
esta roda de náusea em que giramos
até à idiotia
esta pequena morte
e o seu minucioso e porco ritual
esta nossa razão absurda de ser


Não tu és da cidade aventureira
da cidade onde o amor encontra as suas ruas
e o cemitério ardente
da sua morte
tu és da cidade onde vives por um fio
de puro acaso
onde morres ou vives não de asfixia
mas às mãos de uma aventura de um comércio puro
sem a moeda falsa do bem e do mal

Nesta curva tão terna e lancinante
que vai ser
que já é
o teu desaparecimento
digo-te adeus
e como um adolescente
tropeço de ternura por ti.
Alexandre O'Neill
-Estás muito bonita! Fazes-me lembrar um tango de Arola que eu ouvia no cabaré 'Parda Flora', em Buenos Aires.
- Talvez houvesse por lá alguém parecido comigo?
- Não. É precisamente por não te pareceres a ninguém que gostaria de te encontrar sempre. em toda a parte.
in A balada do Mar Salgado, Corto Maltese

Sunday, May 15, 2005

Litania

o teu rosto inclinado pelo vento;
a feroz brancura dos teus dentes;
as mãos, de certo modo, irresponsáveis,
e contudo sombrias, e contudo transparentes;

o triunfo cruel das tuas pernas,
colunas em repouso se anoitece;
o peito raso, claro, feito de água;
a boca sossegada onde apetece

navegar ou cantar, o simplesmente ser
a cor de um fruto, o peso de uma flor;
as palavras mordendo a solidão,
atravessadas de alegria e de terror,

são a grande razão, a única razão.

eugénio de andrade

Nova, nova, nova, nova

não era a minha alma que queria ter.
esta alma já feita, com seu toque de sofrimento
e de resignação, sem pureza nem afoiteza
queria ter uma altura nova.
decidida capaz de tudo ousar.
nunca esta que tanto conheço, compassiva, torturada de trazer por casa.
a alma que eu queria e devia ter
era uma alma asselvajada, impoluta, nova, nova, nova, nova!

irene lisboa

tabacaria

não sou nada.
nunca serei nada.
não posso querer ser nada.
à parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.

janelas do meu quarto,
do meu quarto de um dois milhões do mundo que ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
real, impossivelment real, certa, desconhecidamente certa,
com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,
com a morte a pôr humidade nas paredes e cabelos brancos nos homens,
com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.

estou hoje vencido, como se soubesse a verdade.
estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,
e não tivesse mais irmandade com as coisas
senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua
a fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada
de dentro da minha cabeça,
e uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida.

estou hoje perplexo com quem pensou e achou e esqueceu.
estou hoje dividido entre a lealdade que devo
à Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora,
e à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro.

falhei em tudo.
como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada.
a aprendizagem que me deram,
desci dela pela janela das traseiras da casa,
fui até ao campo com grandes propósitos.
mas lá encontrei só ervas e árvores,
e quando havia gente era igual à outra.
Saio da janela, sento-me numa cadeira. em que hei-de pensar?

que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou?
ser o que penso? mas penso ser tanta coisa!
e há tantos que pensam ser a mesma coisa que não pode haver tantos!
Génio? Neste momento
Cem mil cérebros se concebem em sonho génios como eu,
E a história não marcará, quem sabe?, nem um,
Nem haverá senão estrume de tantas conquistas futuras.
não, não creio em mim.
em todos os manicómios há doidos malucos com tantas certezas!
eu, que não tenho certeza nenhuma, sou mais certo ou menos certo?
Não, nem em mim...
Em quantas mansardas e não-mansardas do mundo
Não estão nesta hora génios-para-si-mesmos sonhando?
Quantas aspirações altas e nobres e lúcidas —
Sim, verdadeiramente altas e nobres e lúcidas —,
E quem sabe se realizáveis,
Nunca verão a luz do sol real nem acharão ouvidos de gente?
O mundo é para quem nasce para o conquistar
E não para quem sonha que pode conquistá-lo, ainda que tenha razão.
Tenho sonhado mais que o que Napoleão fez.
Tenho apertado ao peito hipotético mais humanidades do que Cristo,
Tenho feito filosofias em segredo que nenhum Kant escreveu.
Mas sou, e talvez serei sempre, o da mansarda,
Ainda que não more nela;
Serei sempre o que não nasceu para isso;

Serei sempre só o que tinha qualidades;
Serei sempre o que esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta,
E cantou a cantiga do Infinito numa capoeira,
E ouviu a voz de Deus num poço tapado.
Crer em mim? Não, nem em nada.
Derrame-me a Natureza sobre a cabeça ardente
O seu sol, a sua chuva, o vento que me acha o cabelo,
E o resto que venha se vier, ou tiver que vir, ou não venha.
Escravos cardíacos das estrelas,
Conquistamos todo o mundo antes de nos levantar da cama;
Mas acordamos e ele é opaco,
Levantamo-nos e ele é alheio,
Saímos de casa e ele é a terra inteira,
Mais o sistema solar e a Via Láctea e o Indefinido.

(Come chocolates, pequena;
Come chocolates!
Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.
Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria.
Come, pequena suja, come!
Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes!
Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folha de estanho,
Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida.)

Mas ao menos fica da amargura do que nunca serei
A caligrafia rápida destes versos,
Pórtico partido para o Impossível.
Mas ao menos consagro a mim mesmo um desprezo sem lágrimas,
Nobre ao menos no gesto largo com que atiro
A roupa suja que sou, em rol, pra o decurso das coisas,
E fico em casa sem camisa.
(Tu que consolas, que não existes e por isso consolas,
Ou deusa grega, concebida como estátua que fosse viva,
Ou patrícia romana, impossivelmente nobre e nefasta,
Ou princesa de trovadores, gentilíssima e colorida,
Ou marquesa do século dezoito, decotada e longínqua,
Ou cocotte célebre do tempo dos nossos pais,
Ou não sei quê moderno — não concebo bem o quê —
Tudo isso, seja o que for, que sejas, se pode inspirar que inspire!
Meu coração é um balde despejado.
Como os que invocam espíritos invocam espíritos invoco
A mim mesmo e não encontro nada.
Chego à janela e vejo a rua com uma nitidez absoluta.
Vejo as lojas, vejo os passeios, vejo os carros que passam
Vejo os entes vivos vestidos que se cruzam,
Vejo os cães que também existem,
E tudo isto me pesa como uma condenação ao degredo,
E tudo isto é estrangeiro, como tudo.)

Vivi, estudei, amei e até cri,
E hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu.
Olho a cada um os andrajos e as chagas e a mentira,
E penso: talvez nunca vivesses nem estudasses nem amasses nem cresses
(Porque é possível fazer a realidade de tudo isso sem fazer nada disso);
Talvez tenhas existido apenas, como um lagarto a quem cortam o rabo
E que é rabo para àquem do lagarto remexidamente.

Fiz de mim o que não soube
E o que podia fazer de mim não o fiz.
O dominó que vesti era errado.
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi ao espelho,
Já tinha envelhecido.
Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado.
Deitei fora a máscara e dormi no vestiário
Como um cão tolerado pela gerência
Por ser inofensivo
E vou escrever esta história para provar que sou sublime.

Essência musical dos meus versos inúteis,
Quem me dera encontrar-te como coisa que eu fizesse,
E não ficasse sempre defronte da Tabacaria de defronte,
Calcando aos pés a consciência de estar existindo,
Como um tapete em que um bêbado tropeça
Ou um capacho que os ciganos roubaram e não valia nada.

Mas o Dono da Tabacaria chegou à porta e ficou à porta.
Olho-o com desconforto da cabeça mal voltada
E com o desconforto da alma mal-entendendo.
Ele morrerá e eu morrerei.
Ele deixará a tabuleta, eu deixarei os versos.
A certa altura morrerá a tabuleta também, e os versos também.
Depois de certa altura morrerá a rua onde esteve a tabuleta,
E a língua em que foram escritos os versos.
Morrerá depois o planeta girante em que tudo isto se deu.
Em outros satélites de outros sistemas qualquer coisa como gente
Continuará fazendo coisas como versos e vivendo por baixo de coisas como tabuletas,
Sempre uma coisa defronte da outra,
Sempre uma coisa tão inútil como a outra,
Sempre o impossível tão estúpido como o real,
Sempre o mistério do fundo tão certo como o sono de mistério da superfície,
Sempre isto ou sempre outra coisa ou nem uma coisa nem outra.
Mas um homem entrou na Tabacaria (para comprar tabaco?),
E a realidade plausível cai de repente em cima de mim.
Semiergo-me enérgico, convencido, humano,
E vou tencionar escrever estes versos em que digo o contrário.

Acendo um cigarro ao pensar em escrevê-los
E saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos.
Sigo o fumo como uma rota própria,
E gozo, num momento sensitivo e competente,
A libertação de todas as especulações
E a consciência de que a metafísica é uma consequência de estar mal disposto.

Depois deito-me para trás na cadeira
E continuo fumando.
Enquanto o Destino mo conceder, continuarei fumando.

(Se eu casasse com a filha da minha lavadeira
Talvez fosse feliz.)
Visto isto, levanto-me da cadeira. Vou à janela.

O homem saiu da Tabacaria (metendo troco na algibeira das calças?).
Ah, conheço-o; é o Esteves sem metafísica.
(O Dono da Tabacaria chegou à porta.)
como por instinto divino o Esteves voltou-se e viu-me.
acenou-me adeus, gritei-lhe Adeus ó Esteves!, e o universo
reconstruiu-se-me sem ideal nem esperança, e o dono
da Tabacaria sorriu.

autopsicografia

o poeta é um fingidor.
finge tão completamente
que chega a fingir que é dor
a dor que deveras sente.

e os que lêem o que escreve,
na dor lida sentem bem,
não as duas que ele teve,
mas só a que ele não tem.

e assim nas calhas de roda
gira, a entreter a razão,
esse comboio de corda
que se chama o coração.

fernando pessoa

Wednesday, May 11, 2005

A aventura de um fotógrafo - Amores difíceis

“Basta empezar a decir de algo ‘¡Ah! ¡Qué bonito, habría que fotografiarlo!’ y ya estás en el terreno de quien piensa que todo lo que no se fotografía se pierde, es como si no hubiera existido, y por lo tanto, para vivir verdaderamente hay que fotografiar todo lo que se pueda, y para fotografiarlo todo es preciso, o bien vivir de la manera más fotografiable posible, o bien considerar fotografiable cada momento de la própia vida. La primera vía lleva a la estupidez, la segunda a la locura.” Italo Calvino

Tuesday, May 10, 2005

Minibiografia

Não me quero com o tempo nem com a moda
Olho como um deus para tudo de alto
Mas zás! do motor corpo o mau ressalto
Me faz a todo o passo errar a coda.
Porque envelheço, adoeço, esqueço
Quanto a vida é gesto e amor é foda;
Diferente me concebo e só do avesso
O formato mulher se me acomoda

E se nave vier do fundo espaço
Cedo raptar-me, assassinar-me, cedo:
Logo me leve, subirei sem medo
À cena do mais árduo e do mais escasso.
Um poema deixo, ao retardador:
Meia palavra a bom entendedor.
Luísa Neto Jorge
Erros meus, má fortuna, amor ardente
Em minha perdição se conjuraram;
Os erros e a fortuna sobejaram,
Que para mim bastava amor somente.

Tudo passei; mas tenho tão presente
A grande dor das cousas que passaram,
Que as magoadas iras me ensinaram
A não querer já nunca ser contente.


Errei todo o discurso de meus anos;
Dei causa [a] que a Fortuna castigasse
As minhas mal fundadas esperanças.

De amor não vi senão breves enganos.
Oh! quem tanto pudesse, que fartasse
Este meu duro Génio de vinganças!

Luís de Camões
"we do not inherit the earth from our ancestors, we borrow it from our children" provérbio indio
“Pastelaria
Afinal o que importa não é a literatura
nem a crítica de arte nem a câmara escura

Afinal o que importa não é bem o negócio
nem o ter dinheiro ao lado de ter horas de ócio

Afinal o que importa não é ser novo e galante-
ele há tanta maneira de compor uma estante!

Afinal o que importa é não ter medo: fechar os olhos frente ao precipício
e cair verticalmente no vício


Não é verdade, rapaz? E amanhã há bola
antes de haver cinema madame blanche e parola

Que afinal o que importa não é haver gente com fome
Porque assim como assim ainda há muita gente que come

Que afinal o que importa é não ter medo
de chamar o gerente e dizer muito alto ao pé de muita gente
Gerente! Este leite está azedo!

Que afinal o que importa é pôr ao alto a gola do peludo
à saida da pastelaria, e lá fora – ah, lá fora! – rir de tudo

No riso admirável de quem sabe e gosta
ter lavabos e muitos dentes brancos à mostra”
Mário Cesariny
in time of daffodils(who know
the goal of living is to grow
)
forgetting why,remember how


in time of lilacs who proclaim
the aim of waking is to dream,
remember so(forgetting seem)


in time of roses(who amaze
our now and here with paradise)
forgetting if,remember yes

in time of all sweet things
beyond whatever mind may comprehend,
remember seek(forgetting find)


and in a mystery to be
(when time from time shall set us free)
forgetting me,remember me

ee cummings

Sunday, May 08, 2005

Eu Fiz Um Poema
Eu fiz um poema belo
e alto
como um girassol de Van Gogh
como um copo de chope sobre o mármore
de um barque um raio de sol atravessa
eu fiz um poema belo como um vitral
claro como um adro...
Agora
não sei que chuva o escorreu
suas palavras estão apagadas
alheias uma à outra como as palavras de um dicionário.

Eu sou como um arqueólogo decifrando as cinzas de uma cidade mota.
O vulto de um velho arqueólogo curvado sobre a terra...
Em que estrela, amor, o teu riso estará cantando?

mário quintana
Poeminha do Contra
(Mário Quintana)

Todos esses que aí estão
atravancando meu caminho,
eles passarão...eu passarinho.